Ontem foi domingo e fui passear com a minha família. Eu, meu marido e minha filha acampamos na beira de uma lagoa espelho d’agua, cercada por morros enormes, de um pôr do sol mágico. Muitos amigos e gente sorrindo e se abraçando por toda parte. As crianças se divertiram na lagoa rasinha com bola, espaguete e colchão de ar e se fartaram em piqueniques flutuantes, debaixo do guarda-sol onde as mães ficavam olhando os pequenos e curtindo o sol e o som.

Sim, tinha som. Psytrance no main floor e gêneros variados no Chill Out. A “diversão dos adultos” e também locais para nós sagrados onde celebramos a vida e a conexão com a natureza. Mas minha filha também os aproveitou: coloco nela os abafadores auditivos e ela se vai… dançar, correr, pintar o rosto, brincar de bambolê, malabares, swing poi ou slackline, junto com a galera das artes que sempre recebe muito bem os pequenos tranceiros, como todos ali. Criança traz luz pra nossa vivência, e arranca sorrisos e vibe boa por onde passa.

E quando ela enjoa de tudo isso? Brinca de Barbie no meio da pista! Sim, porque não se trata de incutir na mente dela a minha visão de mundo, mas de oportunizar que ela viva uma experiência diferente do mundo dito “normal”: gente de todas as tribos, compartilhando amor e celebrando uma vida desapegada dos paradigmas impostos pelo sistema que corre a mil lá na cidade, onde há brinquedos caros e crianças enfiadas nos carros, inalando a fumaça do engarrafamento que nos impede de respirar. Quando ela for adulta, vai decidir baseada em todas as experiências. Enquanto é pequena, até hoje nunca recusou uma “festinha” como ela mesma chama.

por @Murilo Ganesh

por @Murilo Ganesh

Pode causar estranheza à pessoas que não vivenciam a cultura alternativa, mas se trata, sim, de um cenário perfeito pra um final de semana em família, em todos os sentidos da palavra, pra silenciar as vozes levianas que julgam sem conhecer a vida e o coração de quem está lá, apenas vivendo aquilo que acredita.

Hoje em dia muitos festivais (lembrando que rave é rave, festival é festival) têm incluindo, além da alimentação mais voltada às crianças, o serviço de “Espaço Kids” para atender as famílias, cada vez mais frequentes, sobretudo os que resgatam a essência do movimento psicodélico. São disponibilizados recreacionistas e atividades culturais para os pequenos como oficinas de arte, pintura, contação de histórias e até teatro infantil, além das brincadeiras que divertem a família inteira.

É responsabilidade de cada mãe e cada pai saber conduzir a vivência de seus filhos dentro do festival, escolhendo os momentos e os locais adequados pra que eles se divirtam em segurança, como se deve fazer em qualquer lugar que se leve uma criança.

E o que eles ganham, não tem preço. Minha filha tem convivido em verdadeiras aldeias de irmãos, gente que se olha nos olhos, compartilha e coopera entre si, fala de amor e respeita a natureza; pessoas de tipos diferentes mostrando que não somos só o corpo, nem o quanto temos de grana no bolso, cada um oferecendo o que tem de melhor em histórias contadas na volta de uma fogueira, nosso local de comunhão, onde passamos a noite conversando, dançando (por que não?) e velando o sono dos pequenos nas barracas.

Minha pequena tranceira (cinco anos) vive a fantasia de ser uma fada encantada. No último festival que fomos, ela acordou as cinco horas da manhã e eu resolvi convidá-la pra ir com a gente ver o sol nascer na beira da lagoa. Ela ficou maravilhada e contou pra todos os amiguinhos que ela estava “grande”, pois andou com os adultos de madrugada e viu o sol nascer.

Essa pequena conquista, que ela vai levar na memória pra sempre, vale todo o perrengue, todos os Lives e Dj Sets que eu ouvi da barraca e todo o cansaço, que é claro, é dobrado quando se tem que manter a rotina de uma criança. Mas vale, por que é isso que eu quero ensinar a ela: o valor das pequenas coisas, que fazem a essência de tudo.

Meus domingos são assim e vão continuar sendo: família, amigos, muita vibe e o trance não para. Porque essa é a verdade da nossa família, essa é a nossa ESSÊNCIA.

Finalizo com os versos de uma musiquinha composta pela minha Isadora (autodenominada “Vibedora”) ao final de uma das nossas celebrações: “O Trance não para / O Trance não para / Pode crer / Pode crer!”

Um viva à nova geração tranceira!

fotos por @Rodrigo Della Favera