rave

Campinas, 21 de março. Milhares de pessoas se preparavam para aquela que seria a maior edição da Kaballah. Oito horas da noite, caravanas de todo o Brasil, rumo ao Pólo Marquesa, recebiam desolados a notícia: uma liminar da justiça proibiu a realização do evento. Motivo? Um vizinho (que não quer ser identificado) moveu um recurso, sob alegação de barulho.É preciso analisar, que nesse caso, prevaleceu a vontade de apenas uma pessoa, que ganhou [o recurso] porque tinha dinheiro”.

Já há algum tempo essas histórias têm ecoado alto, de norte a sul do país. Mas o que esses e muitos outros casos semelhantes querem dizer? A verdade é que quando não se consegue proibir por leis, autoridades têm conseguido ações judiciais que impedem a realização de uma – e quantas mais forem necessárias – festa. A tendência pegou principalmente nos últimos três anos, depois do boom da música eletrônica. Foi com a popularização das raves que os problemas judiciais começaram a aparecer, assim como as ocorrências dentro delas. Quando eram pequenas e escassas, poucos se importavam, mas bastaram sair dos cafundós e adentrar nos domicílios, para serem cutucadas.
A questão é que fatos como mortes, roubos, brigas e reclamações de vizinhos por barulho, por mais esporádicos que sejam, são motivos para um alvará negado. Mas será que as avaliações têm sido feitas com justiça? Onde começa o direito de um, onde termina o do outro? São posições que esbarram em argumentos do tipo: “não existem brigas em raves”, “as festas são da paz”, “não há mais uso de drogas do que em outros eventos”… Essas afirmações se respaldam na percepção de que em carnaval e outras festividades, acontece tudo aquilo e mais um pouco. É sabido que em micaretas e muitos outros eventos, todos consomem bebidas alcoólicas muito além do normal, acarretando em mortes e acidentes, e mesmo assim, elas são toleradas. Também não é possível dizer com precisão em que locais as drogas são mais usadas, pois as estatísticas no Brasil ainda estão sendo mapeadas. Mas então… Por que tanta perseguição aos eventos de música eletrônica? Seria censura? Preconceito? Precaução? Mas… proibir esse tipo de festa, que é uma manifestação cultural, seria uma boa precaução?
Essa questão envolve posicionamentos ideológicos, criminais, judiciais, culturais, sociológicos e até mesmo constitucionais, já que o Artigo 215 do texto constitucional da cultura diz que “O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais”.
A proibição é um fato em alguns lugares, mas em muitos outros, apenas tentativas frustradas. A alternativa para os políticos, então, é alterar o texto para a regulamentação. Solução, inclusive, aceita pela maioria dos organizadores de eventos, que veem como algo bom e necessário para a cena e para toda a comunidade. Mas a questão é: De que forma será feita essa regulamentação, sem que prejudique a essência e a proposta de uma rave? Sem que prejudique o mercado que emprega milhares de pessoas? Para isso, os empresários da cena gostariam de dialogar com os poderes públicos, e juntos encontrarem um consenso. Porém, as reclamações são no sentido de que as leis são autoritárias e não propõem o diálogo. A maioria das regulamentações atuais visam a enquadrar as raves nos parâmetros de festas já existentes, como uma boate em local fechado. Da forma como está sendo feita, sem debates, força por tabela, a extinção delas.
A solução mais urgente é a união entre autoridade e empresários da cena, para que sentem, discutam, dialoguem e cheguem às conclusões mais adequadas.
A sociedade pode perder muito com essa história. Mas também pode aprender. O rock continua vivo… E a música eletrônica? Só depende de cada um de nós a sua sobrevivência. Pois, abrir-se para o novo, também é se desenvolver.